Reutilizar produtos de Uso Único?

Reutilizar produtos de Uso Único?

Reutilizar produtos de Uso Único?

A reutilização de materiais nos hospitais e centros médicos é um assunto complexo e com grande potencial danoso para a saúde tanto dos pacientes quanto dos profissionais que os manuseiam nas intervenções cirúrgicas nos processos de limpeza, desinfecção e esterilização.


A Anvisa revisou a legislação sobre o reprocessamento com a edição de três novas resoluções: a RDC 156/06 e as REs 2605/06 e 2606/06. A RE 2605/06 lista cerca de 100 produtos médicos de uso único cujo reprocessamento não é permitido. Já a RE 2606/06, que estabelece parâmetros como guia de protocolos a serem adotados pelos estabelecimentos que fazem o reprocessamento, visando garantir a segurança e a eficácia dos produtos reprocessados, estabeleceu a data limite de agosto de 2007 para implantar os protocolos. Esta data foi postergada para fevereiro de 2008, através da RE 2305, de julho de 2007. Somente em dezembro de 2007, através da Portaria 1001 da Anvisa, foi criado um Grupo de Trabalho para regulamentar as atividades dos serviços que realizam reprocessamento cujo prazo também se extinguiu em 03 de junho de 2008. A RDC 156/06 dispõe sobre a rotulagem e o registro dos produtos e outras adequações voltadas para as indústrias. De acordo com essas regulamentações, a Anvisa define os produtos como "produtos com reprocessamento proibido" e "produtos passíveis de reprocessamento".


 O problema está nos produtos não inclusos nessa lista de produtos de uso único. De acordo com a resolução, os materiais que não estiverem na lista poderão ser reutilizados ou reprocessados, obedecendo a  Protocolos a serem desenvolvidos pelas empresas de serviços e aprovados pela Anvisa, cujos critérios não nos parecem bem estabelecidos. Trata-se de uma questão polêmica, pois os fabricantes  são claros de que não têm como garantir a segurança dos seus produtos após o primeiro uso, e esta responsabilidade, conforme a atual regulamentação é total das entidades de serviços que os reprocessam.


Na opinião dos fabricantes importadores,  os produtos de uso único não devem ser reprocessados. Não existe viabilidade técnica para uma fiscalização eficiente nem garantia de segurança da vida do paciente em casos de reuso. O reprocessamento de produtos de uso único é admitido porque, conforme consideração na RDC 156, “a reutilização de produtos médicos rotulados para uso único tem sido uma prática largamente encontrada nos serviços de saúde do Brasil e do exterior”.


 O principal problema a nosso ver é o fato da Anvisa legalizar uma atividade que representa risco para a saúde da população ao mesmo tempo em que sabemos que é difícil sua fiscalização.  O reuso de materiais que foram desenvolvidos para serem usados uma única vez contribuem com a infecção cruzada e à adquirida em hospitais.


 Na atual regulamentação não há nenhuma menção à necessidade de o paciente ser  comunicado previamente, da possibilidade de uso de um produto médico reutilizado. Temos denunciado uma clara ignorância da legislação aos princípios éticos relacionados com os direitos dos pacientes e as conseqüências legais em cadeia  no caso de  danos ao paciente tratado com dispositivos médicos de uso único reprocessados. A  falta de clareza de como a Anvisa poderá efetivamente fiscalizar o reprocessamento desses produtos, preocupa toda a cadeia do setor de saúde.


 Estudos de várias fontes demonstram que o reprocessamento de produtos destinados a uso único pode afetar a funcionalidade dos mesmos, com sérios riscos aos pacientes,  tais como:


- resíduos da utilização anterior como sangue e seus componentes, secreções e outros componentes corpóreos, que podem resultar em 'sujeira' estéril, podendo levar, entre outras implicações mais graves, a reações alérgicas, e/ou resíduos de agentes de limpeza ;


- alterações nas propriedades físicas, químicas ou funcionais dos dispositivos médicos reprocessados, que podem falhar durante um procedimento cirúrgico, ou mesmo romper-se dentro do corpo do paciente;


-  dificuldade de rastreabilidade dos produtos reutilizados, contrariando a própria definição do que vem a ser uma "vigilância" sanitária.


 Apesar da atual regulamentação prever que as entidades prestadoras de serviços hospitalares sejam responsáveis e elaborem e validem seus protocolos, a Abimed entende que os atuais fatos de contaminação vêm atestar o que já se comenta há muito tempo. O reuso é um perigo iminente de infecção hospitalar.  Temos receio de que as ações da Anvisa em querer limitar e restringir o número de procedimentos e equipamentos, não seja suficiente e vá na contramão da sua própria missão, que é proteger e promover a saúde da população, garantindo a segurança sanitária de produtos. Além disso, coloca a vida de todos os brasileiros numa verdadeira roleta-russa.


 Todo o setor de saúde deve estar muito atento para evitar que mais pacientes sejam vítimas, por conta do reuso de produtos médicos. Empresas fabricantes e distribuidoras devem reforçar junto aos seus clientes e prestadores de serviços  a responsabilidade que têm para com a qualidade dos produtos reprocessados. Hospitais, clínicas e todos os profissionais envolvidos no setor de saúde devem averiguar a procedência dos produtos. Utilizar produtos reprocessados  já é por si só um risco aos pacientes, muito mais sem a certeza de cumprimento dos procedimentos estabelecidos pelas regulamentações da Anvisa. Cada cidadão, profissional ou paciente, deve considerar-se usuário potencial, e como tal, servir de agente fiscalizador dessa prática.